II SEMANA CULTURAL MEU BRASIL RAIZ

Divino

Divinopor Valter de Moraes (2025)

No último domingo, cancelei compromissos, reuni a família e fui para as ruas de Mogi ver aquilo que, aparentemente, apenas eu não tinha.

Os tambores e vozes da Entrada dos Palmitos já me haviam chamado outras vezes. E então, como filho ausente que revisita a própria história, sentado na sarjeta e levado de bandeirinhas e ansiedade é que me fiz... embevecido.

Por alguns momentos, a impressão de que me faltavam os sentidos. Talvez, por tanto haver...

Eram cores demais e sons e emoção! Era dignidade demais!

Nas bandeiras e nas flores, nas fitas e nos rostos, o vermelho lembrava o sangue fazendo a vida fluir. Enganei-me. Era o Espírito Divino, descendo como fogo, vindo como pentecostes, escorrendo pelas ruas de Mogi, abençoando e acordando a cidade que, feito a nação, esquecera-se de despertar.

E a congada veio..., e outra... E a marujada... Deixei-me levar e ser trazido, benzido pelas mãos da arte popular e pelas rezas...

“Eu quero (como eu quero!)
Te dar a paz
Do meu Senhor
Com muito amor.”


Aceitei o presente. Como quem não tem escolha.

De repente, um pretinho-tão-menino: chupeta e instrumento na mão... Ah, Meu Deus, graças por ter fé e poder vê-lO como só podem os puros de coração. Sou bem-aventurado como essa gente me faz!... E Você se manifestando, mais uma vez, nos instantes mais prosaicos...


Uma legião de bandeiras cantando, metamorfoseando-se em crível milagre: passam carros, passam bois, passam amigos, passam alunos de outrora e mogianos-sentidores...

soures tambores e
orações...


Depois que Santa Cecília passou, com sua banda, eram só silhuetas molhadas...

Os animais, as crianças, a História, as missões...

Todos dentro de mim... Mogi... Boygi.


Antes do fim, já era eu somente gratidão. Ao Espírito Santo do povo que me fez sentir tão povo também. Orgulhoso de ser caipira, tão mogiano, e brasileiro, e gente enfim...




Valter de Moraes é professor, escritor e celebrante, com sólida trajetória na área de Linguagens e Comunicação. Graduado em Letras e Pedagogia, com especialização em Língua Portuguesa, Filosofia e Educação para a Carreira e Projetos de Vida, atua há mais de trinta anos no magistério, em escolas técnicas, regulares e cursos preparatórios.

Professor de Comunicação em Multimeios e Marketing no SENAI “Nami Jafet” (Mogi das Cruzes), é reconhecido por sua habilidade em transformar a palavra falada e escrita em instrumento de expressão, empatia e reflexão.

Autor de materiais didáticos para as editoras Moderna e Somos, Valter também é mestre de cerimônias e celebrante desde 2006, além de cronista e poeta, com obras publicadas e participações em eventos literários nacionais.

Seu trabalho combina clareza didática, sensibilidade artística e domínio da linguagem, resultando em experiências marcantes de comunicação, ensino e celebração da vida.



Livro: - Nós: os outros (Nova Literarte, 2018, por Valter de Moraes)

"Em mais de meio século, pude conhecer algumas pessoas admiravelmente boas e outras extremamente más. Essa conclusão acerca de um e outro perfil demanda vários longos anos de observação. As primeiras impressionam por sua postura ética em cada detalhe do comportamento; as cruéis assombram por suas incansáveis manobras para se parecerem gente de bem. Independentemente dessa diversidade, todas me lembram de quem sou. Nas pequenas narrativas (contos e crônicas), nos poemas de versos livres e brancos, minha alma se mostra revelando a soma de todos os outros. Sou todos e todos estão em mim."